Chegamos ao estágio em que você tem um relatório de due diligence para orientar todo o seu processo de decisão. Com o mínimo esforço paralelo à due diligence, o clube já pode começar a prever seu fluxo de caixa, sabendo onde perde milhares de recursos e está ciente de suas falhas de controle que precisam ser corrigidas prontamente.
Chegamos na fase de consultoria. Mas, novamente, sem governança. Muito menos TI, exceto que seu clube ainda esteja na idade da pedra em termos de tecnologia.
A governança, neste ponto, serve à narrativa. A governança dá ao consultor dinheiro fácil e sem esforço, se limitando a ntrega de um organograma e diversas sugestões para melhoria da estrutura de controle, deixando todo desenho e implementação nas mãos dos clubes.
Consultores vão sugerir nomes e novas funções, além de despesas, tanto na contratação quanto na rescisão. Eles copiarão como estão estruturados outros clubes, principalmente europeus, que vivem uma realidade oposta aos brasileiros. Ou pior, conselheiros serão usados como atores independentes para distribuir posições de acordo com as demandas políticas dos clubes, amigos e qualquer tipo de indicação pessoal.
O primeiro consultor a ser chamado neste momento é o de reestruturação. Este assessor dará o impulso para refinanciar as dívida, propor cortes de despesas, buscar uma estrutura mínima e não a ideal e perfeita, usualmente entregue em trabalhos de consultoria aqui no Brasil.
Uma estrutura mínima que faça com que o clube gere ganhos anuais para quitar suas dívidas e buscar uma real reestruturação financeira de longo prazo.
Se você precisa de um consultor para montar um organograma para você, seu lugar não é na administração de um clube. Aliás não teria espaço em qualquer lugar minimamente sério. Não faz sentido estabelecer uma estrutura inteira com muitos funcionários quando seu clube está quase insolvente.
Você também pode chamar serviços de assessoria em relação à melhoria de controles internos, mas pessoas que coloquem a mão na massa, desenhando e implementando rotinas e não apenas lhe passem listas de melhorias e designem responsáveis por cada item. É preciso fazer acontecer e não fingir que prestou algum tipo de consultoria.
Nesse estágio, bons consultores irão sugerir uma transformação no modelo de negócios, de associativo, “sem fins lucrativos”, para corporativo. Se você tiver bom senso, pode avaliar a contratação de serviços jurídicos nesse sentido, para estudo, junto com a reestruturação de pessoal, que tenha networking para encontrar potenciais investidores.
Essa abolição do modelo de associação de clubes no Brasil é uma questão muito complexa. Prometo escrever muito sobre isso em breve.
Gostaria de concluir esta parte com alguns esclarecimentos extras para evitar qualquer interpretação errônea de governança sobre meu ponto de vista.
Tive a sorte de trabalhar com profissionais espetaculares, auditoria e parceiros de consultoria competentes. Um deles, um senhor português, muito amável no tratamento e muito severo no processo de revisão, disse algo precioso, que resumirei aqui.
Governança e compliance eram características inerentes a qualquer tipo de gestão. Não fazia muito sentido abordar as melhorias de governança ou ter um foco exacerbado na conformidade. Afinal, se isso era necessário, era apenas um indício de que uma organização tinha gestores com capacidade abaixo de suas responsabilidades.
Essa discussão ocorreu fora do ambiente do futebol, naquelas reuniões internas de cross-selling na Big4. Essas práticas emergentes continuaram pedindo aos auditores ajuda na venda de serviços para eles.
Quando se pensa com um pouco mais de atenção no futebol brasileiro, o pensamento do nobre sócio português ganha ainda mais sabedoria.
O dirigente do clube brasileiro, via de regra, fica muito aquém do que se deseja em termos de habilidades e competência. Portanto, a solução está mais ligada à mudança do perfil do gestor do que à contratação de uma consultoria de governança. Você não coloca uma Ferrari na mão de uma criança de sete anos, coloca?
A meu ver, o conselho gestor que busca consultoria de governança demonstra incapacidade de desempenhar suas funções.
Parece excessivamente agressivo e vai me causar algum tipo de aborrecimento pessoal (a maioria dos leitores me conhece ou conhece alguém que me conhece), mas é como eu penso. Não estou aqui para enrolar as pessoas, muito menos para ajudar a vender serviços de “secar de gelo”.